Categoria: Memórias

  • Carol ou Fernanda?

    Carol ou Fernanda?

    Se passo em algum lugar e alguém que não conheço me olha de um jeito diferente, já sei exatamente o que a pessoa está pensando: que sou quem não sou.

    Aconteceu na loja de cosméticos, quando a atendente veio correndo passando na frente da outra atendente.

    No café, acharam se tratar dela e não de mim.

    No bar na calçada da Augusta, os rapazes da mesa ao lado conferiram no telefone a foto dela, que obviamente não era a minha.

    O garçom do restaurante em Salvador, que veio ao pé do ouvido me perguntar se eu era ela. Mas eu sou eu.

    Teve o marido da aluna, a amiga da amiga, a conhecida, o conhecido, o vizinho e a vizinha. Todos achavam eu muito parecida com ela.

    Já tiramos fotos juntas, já lhe entreguei um presente, já a encontrei numa exposição. Só ela não pensava que eu podia ser ela.

    Até o dia em que uma amiga me viu de longe no aeroporto. Levou um susto ao perceber que não era eu, era ela! A Fernanda.

  • Olhar pra trás

    Olhar pra trás

    No finzinho do ano tenho mania de olhar pra trás e ver o que fiz de bom.

    Se andei umas três casas pra frente ou se voltei duas.

    Depois de rememorar os dias de 2022 escritos na minha agenda, posso me garantir: fui feliz.

    Fiquei triste, desesperada, sofri, chorei sozinha, porém menos vezes que as que ri, conversei com amigos e tive novas ideias.

    Vinte-e-dois foi o ano que tive minha vida mais perto do que era antes daquela sexta-feira treze de março de vinte-vinte. Minha mente respirou aliviada, meus braços abraçaram quem eu queria e beijei quem tive vontade.

    Filmes, livros e música me fizeram companhia, assim como velhos amigos e novos, que chegaram de fininho e encontraram um espacinho no meu coração. Como é bom!

    Obrigada, 2022. Silenciosamente agradeço a mim mesma e aos meus 44 anos de vida que me fizeram um pouco melhor.

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    Músicas que não saíram da minha cabeça

    • Mockinbirds, Mark Lanegan

    • Oceania, Smashing Pumpkins

    • Whiteout, Warpaint

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    Filmes que me emocionaram

    • Deserto Particular, Aly Muritiba

    • Great Freedom, Sebastian Meise

    • Bergman Island, Mia Hansen-Løve

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    Séries que me fizeram rir e chorar

    • Marvelous Mrs. Maisel, Amy Sherman-Palladino e Daniel Palladino

    • My brilliant friend, Saverio Costanzo

    • Irma Vep, Olivier Assayas 

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    Livros que embarquei

    • O parque das irmãs magníficas, Camila Sosa Villada

    • Arrastados e Todo dia a mesma noite, ambos de Daniela Arbex

    • Lula volume 1, Fernando Morais

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    * Devo ter sido injusta com várias outras obras. Não foi missão fácil escolher entre os 124 filmes assistidos e os 32 livros lidos. Sobre as músicas: tenho alma saudosista. Sempre volto para as influências da minha adolescência. Saudades 🙂

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    Melhor notícia do ano

    Lula ganhou as eleições!

  • Arquitetura da memória

    Arquitetura da memória

    O tempo todo tudo muda.

    Uma casinha é demolida para dar lugar ao prédio modernoso.

    Uma árvore é cortada com a desculpa de que o vento pode fazer ela cair.

    Uma calçada de ladrilho antigo dá lugar ao revestimento novinho e brilhante.

    Um pouco de saudosismo faz a gente se apegar às coisas do passado.

    Mas há também beleza e história pra contar ao preservar essas coisas do passado.

    Até a minha pequena cidade mineira já não é mais a mesma da minha memória.

    Na lembrança, ainda tenho vivinha a imagem do Cine Presidente de arquitetura art déco, todo em tons pastéis. Tenho também a memória dos filmes que assisti ali. Das sessões animadas dos filmes dos Trapalhões, na infância, e de “Garota, interrompida”, que me marcou a adolescência.

    Lembro também do bairro residencial apenas com casas, hoje tomado por prédios.

    Da loja da esquina da praça, onde a gente ganhava uma bola colorida do meu vô.

    Aqui onde moro também já não é o mesmo lugar.

    Havia meu predinho preferido no centro da cidade. Foi demolido num domingo quieto, sem alarde. Já era.

    O colégio onde passei a vida. Prédio brutalista, com um teatro interessantíssimo. Já deixou de ser colégio. Com o coração dolorido constato que, por fim, virou uma igreja.

    Há mudanças boas, mas nessas só vejo ganância e equívoco.

    Me resta lembrar.

  • Brincadeira

    Brincadeira

    Meu pai guarda alguns brinquedos que teve na infância. Um soldadinho de madeira e um barquinho de metal. Aluno exemplar, guardou também dezenas de medalhas de honra ao mérito. Sempre foi o primeiro da turma.

    Meu pai também me conta que tinha um barco de verdade. Eu sempre admirei. Ele pegava seu barquinho de madeira para navegar nas águas dos rios do sul de Minas. Qual criança hoje tem o próprio barco? Meu pai tinha.

    Foi meu pai que me deu meu brinquedo preferido: a casa cogumelo do Mundo Feliz. Hoje só guardo na memória o tanto que brinquei ali.

    Me lembro também de quando meu pai me dava brinquedos em dias aleatórios, sem nenhuma pompa e comemoração. E de quando ele trouxe um brinquedo muito especial na volta de uma viagem. Eu achava muito pra mim. Nos anos oitenta era assim. Não se podia ter tudo e tudo bem! Quando ganhava, tinha um gosto de merecimento, de esforço. O esforço dos meus pais.

    Esse post ficou jogado nos rascunhos por um bom tempo. Não me lembro mais porque comecei a falar de brinquedos. Mas posso ter certeza de que queria falar sobre meu pai.

    *Na foto: meu pai e meu irmão <3

  • Entre o Rio e as montanhas.

    Entre o Rio e as montanhas.

    Depois de mais de um mês participando da oficina de colagem “Álbum de família”, com Pati Peccin e Alicia Ferreira, eis aqui meu álbum pronto!

    Foram semanas revirando fotos antigas, criando uma história em cima da minha história já vivida: minha primeira infância no Rio de Janeiro, alternada com as férias no sul de Minas, entre as montanhas da Mantiqueira.

    Por dias, fiquei com a mesa cheia, entre os recortes, pinturas e combinações. Entre papéis, estilete, guache e cola. E muitas, mas muitas ideias na cachola.

    Não foi tarefa fácil, mas muito prazerosa, reviver momentos e combinarcom imagens achadas, linhas bordadas, carimbos e adesivos. Fui buscar inspiração até no caderno de receitas da minha mãe.

    Os encontros online foram de muita partilha de narrativas familiares. Alguns se emocionaram ao contar a invisibilidade de um ancestral e ao descobrir suas origens. Para coroar a vivência de mais de um mês de encontros regulares, tivemos um encontro presencial no último sábado, com os participantes moradores da ilha. Entre gin e vinho, ostras e pães de queijo, passamos uma tarde agradabilíssima entre amigos antigos e recém feitos. Senti uma pequena amostra de uma vida que já foi normal ao ser recebida no lar da Pati e Aleph.

    Por fim, chegou o dia de folhear o álbum sentada no sofá, entre meu pai e minha mãe: os personagens principais dessa história entre o Rio e as montanhas.

    Assista a todo álbum aqui

  • Español

    Español

    Recentemente, encontrei em casa livros na língua espanhola. Alguns ainda embalados no plástico, com preço anotado na capa. Vieram de viagens a países vizinhos e ficaram aguardando o momento de serem lidos.

    Resolvi começar por um Alejandro Zambra: “Formas de volver a casa”, ainda receosa por ter dificuldades na leitura. O que, ainda bem, não aconteceu.

    O título “Cosas que nunca te dije”, de María José Viera-Gallo, me remeteu ao filme homônimo da diretora Isabel Coixet. Assisti há muitos anos nas zapeadas sem compromisso de canais de filmes Showtime. Nunca mais o revi.

    O livro não tem nada a ver com a obra cinematográfica, foi só uma coincidência de nomes. São contos e está sendo minha última leitura desse dois mil e vinte um. Estou gostando muito!

    A coletânea de contos de autores colombianos, chamada “Puñalada Trapera“, foi encontrada numa livraria pequena e graciosa, a Santo & Seña, que fica no bairro de Chapinero, em Bogotá.

    Nesse lugar também se vendem LPs, fitas cassete e toca-discos e aparelhos de som retrô. Sem contar com as novas polaroids e seus filmes. Tudo tão lindo que fiquei horas passeando e saboreando o espaço,

    Já o livro do chileno Pedro Lemebel , “De perlas y cicatrices”, foi indicado por amigos também chilenos, ao passearmos em uma livraria no agradável bairro de Ñuñoa, em Santiago. Este ainda será lido.

    Nos últimos meses, a língua espanhola tem sido minha companheira. Tinha esquecido de como é bonita e fluida.

    Estudei espanhol na escola na época em que o idioma foi obrigatório por um programa do Mercosul. Éramos adolescentes, cheios de si, e achávamos que não nos serviria para nada. Só passei a dar valor à língua depois de adulta e de visitar países de língua espanhola. Comecei a notar as variedades de palavras de país para país e seus diferentes sotaques. Além das pessoas que conheci e que gosto muito.

    A leitura em espanhol que tenho feito hoje me fez relembrar dos mestres do passado. A professora chilena Alejandra foi a minha preferida. Depois ainda tivemos professores argentinos e até um brasileiro.

    As viagens, os lugares, as comidas, as pessoas. Todos esses sabores, cheiros e memórias têm me visitado através dessa língua, da qual eu fui ingrata por muito tempo.

  • Escolinha de artes

    Escolinha de artes

    Não tenho nenhum registro, além dos desenhos e pinturas guardadas pela minha mãe.

    Ela nos levava a pé, todas as terças e quintas, eu e meu irmão, à escolinha de artes da Biblioteca Municipal aqui de Florianópolis.

    Era meados da década de 80, e passávamos tardes inteiras imersos em variadas técnicas de diferentes expressões artísticas que incluía desenho de observação com carvão, pintura, até teatro e flauta doce.

    Parávamos apenas para o lanche no recreio no meio da tarde.

    Foi lá também que vi o boi-de-mamão e tive contato com a cultura local que até então me era desconhecida.

    Hoje, por outro motivo, fui até a biblioteca depois de muito tempo. Perguntei para uma funcionária se a escolinha de artes ainda existia. Com algum saudosismo, ela me contou que as atividades foram transferidas para o Centro Integrado de Cultura, o CIC. Falou também que muita gente, assim como eu, vinha perguntar da escolinha e mostrava para os filhos onde estudou na infância.

    Penso que a iniciativa da minha mãe na época me abriu possibilidades que me ajudaram a fazer escolhas na minha vida profissional bem mais tarde. Ali entendi que gostava de criar e até hoje a criação é o que me faz feliz.

  • O ato gratuito

    O ato gratuito

    No meio da tarde, meu ateliê fica iluminado. Dali vejo o sol ir gradualmente se escondendo atrás do morro. Hoje estava bem claro e trouxe um pouco de calor nessa segunda úmida e fria.

    Antes disso, apertei o play nesse episódio do podcast Literapia, da amiga Bruna Roisenberg. Ela leu o conto “O ato gratuito” de Clarice Lispector que me embalou: quem não deseja largar tudo no meio da tarde e ir passear num parque? Parar o trabalho e ver a vida de outra perspectiva, tomar um fôlego e recuperar as ideias?

    No caso, Clarice pegou um táxi e foi para o Jardim Botânico. Queria me dar ao luxo de estar nesse momento no Rio de Janeiro. Do Jardim Botânico tenho boas lembranças de infância com as babás ou amiguinhos. Pra mim, era um labirinto divertido no meio das altíssimas jaqueiras, chafarizes, os jambeiros e as famosas palmeiras imperiais.

    Eu e minha amiga Nice.

    Por ora, tenho ao meu alcance largar o bordado, pegar o carro e ir para algum parque da minha cidade. Talvez o Horto que fica perto de casa ou até mesmo o nosso árido jardim botânico.

    Imagino tudo isso, olho para a mesa, as linhas, a tesourinha…e fico. Mas com planos de um dia largar tudo no meio da tarde.

  • Cassete

    Cassete

    Minha adolescência foi nos anos noventa. Recordo com especial carinho o ano de 1993, época em que escutava Ramones sem parar, assistia à MTV o dia inteiro e tinha um grupo de amigas queridas.

    Escutávamos música nas nossas fitas cassetes enquanto os primeiros CDs começavam a aparecer. Com eles, surgiram também as locadoras de CDs onde passávamos as tardes escolhendo o que alugar. Se alguém comprava o álbum do momento, era praticamente obrigado a gravar para os amigos. As capinhas eram caprichosamente escritas a mão, imitando o logotipo da banda com as cores principais da capa do disco.

    As fitas iam e vinham. Às vezes, de mais longe: como presentes de amigos enviados pelos Correios ou a demo daquela banda independente de outro estado.

    Ainda tenho todas aqui. Em cada caixinha, músicas que guardam lembranças de um momento vivido.

  • Achados

    Achados

    Estava remexendo em fotos antigas escaneadas pelo meu irmão e achei mais fotos do meu tio Nestor. Eu nem tinha nascido ainda e ele estava casado com a Ester. E eram todos jovens <3

    Achei tão lindas que resolvi colocar aqui.

    Minha mãe Gabriela, meu irmão Mateus, tio Nestor e Ester.