Já é tradição. Quando não estou fazendo alguma oficina da colagista e amiga Pati Peccin, estou participando de algum encontro de colagens em sua casa.
Há algumas semanas, passei uma tarde de sábado em mais uma edição desses encontros. Revi amigos e conheci outros em meio a recortes de revistas e boas conversas.
De vez em quando deixo o bordado de lado no ateliê, para dar lugar às folhas de papel e revistas. Criar universos inimagináveis com imagens encontradas é bom demais!
Dessa tarde, e pedaço da noite, renderam três criações que compartilho aqui.
Desde a infância sou sócia do Clube Elase por ser filha de um engenheiro eletricista que trabalhou e se aposentou pela Eletrosul.
Ser dependente de um funcionário da empresa me dava a chance de ser automaticamente sócia do clube. Tenho boas lembranças de tardes com meus colegas de escola treinando para as olimpíadas nas quadras da Elase ou em alguma festinha de amigos.
Mais tarde, o clube se emancipou e tornou-se independente da Eletrosul e aberto à comunidade. Foi quando, pela segunda vez e já adulta, me tornei sócia.
Há mais de 15 anos frequento o clube todas as manhãs para praticar meus exercícios diários na academia ou na sala de yoga.
Ali fiz muitos amigos por afinidade ou por convívio.
Ano passado, a Elase inaugurou sua galeria de arte. De lá pra cá, algumas exposições já aconteceram.
Para comemorar os 48 anos do clube, este ano houve uma convocatória entre os artistas associados para compor uma exposição coletiva, da qual eu e Ivan faremos parte no próximo dia 20 de maio, terça-feira, a partir das 19h.
Minhas obras escolhidas para a mostra foram produzidas entre 2018 e 2024.
Esta coletiva é composta por cinco artistas com trabalhos em diferentes técnicas: desenho, pintura, cerâmica, fotografia e bordado.
Aguardo a sua visita!
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Serviço
Exposição dos artistas da Elase Abertura: 20 maio de 2025, terça-feira, às 19h
. Visitação: 20 de maio a 5 de julho, de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h. Sábado, das 9h às 12h Galeria do Clube Elase • Avenida César Seara, 560 – Florianópolis, SC.
Tenho um pouco de culpa ao falar que Cuba foi um dos países que mais gostei de visitar.
Não sou ingênua e sei dos problemas profundos que o país e sua população vivem nesse momento por causa do embargo e também do próprio governo. Vi de perto a escassez de alimentos e remédios para a população.
Mas nenhuma análise que eu fizer aqui vai dar conta de todas as contradições que formam essa ilha.
Vim escrever hoje sobre o que fez eu me apaixonar por este lugar.
Vez ou outra me pego relembrando momentos que lá vivi. A alegria das descobertas de cada canto de Havana. Sua arquitetura, seu povo, os passeios em suas ruas. Talvez seja o país mais seguro que já visitei.
A vida passa devagar onde o capitalismo não se alastrou. Não somos bombardeados com placas, propagandas e produtos supérfluos. A vida corre de outra maneira e em outro tempo.
As crianças ainda brincam na rua, sem celular. Os artistas de rua são graduados em arte na universidade pública.
Existem os museus e as galerias de arte. Tem o cinema cubano e sua tradição de cartazes lindíssimos.
No litoral, tem o azul turquesa do mar caribenho. Mesmo nos dias de céu cinza. E o céu de Trinidad, que me lembrou o de Minas.
Cuba é um lugar onde a gente consegue “dar um passo atrás” no modo de viver. Cuba lembra a gente de como a vida pode ser mais simples, menos corrida e com menos coisas. Lembra também que algo está muito errado no jeito em que vivemos aqui.
Tenho saudades dos dias em que a maior preocupação era escolher entre um mojito ou um daiquiri.
Às vezes a gente pensa que a história que interessa é a de outra vida. Uma vida inventada. Engana-se quem pensa que se inventa sem colocar um pouquinho do que se é. Naquela noite, estavam todas sentadas no chão sobre algumas almofadas espalhadas ou diretamente sobre o tapete. Poucas luminárias deixavam o espaço acolhedor, à meia-luz. Uma roda de mulheres pode ser assustadora a alguns olhos. Menos a elas próprias. Como em outros tempos, sentadas em círculo, pareciam estar ao redor de uma fogueira imaginária. Ali criavam juntas uma nova personagem. Cada uma contribuindo com o que lhe alcançava: uma origem, um ofício, uma vontade. Essa personagem é feliz? Vive em liberdade? Gosta de dançar? Aos poucos, ela foi nascendo e ficando em pé. Ganhando vida própria.
Aos poucos, também, algumas dessas mulheres foram se reconhecendo e se apegando ao novo ser que surgia.
Conforme a vida nascia para essa personagem, a amizade e vínculo nascia entre essas mulheres.
No final da noite, constatou-se: faltou um nome.
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“Não basta dizer que é para isso que serve a ficção: para pôr as nossas coisas inconfessáveis nas almas de personagens inventados”.
Ainda é comum achar um pelo fininho, preto ou branco, em algum lugar da casa.
Hoje foi no teclado do computador.
Tem hora que ele vem voando com o vento que entra pela janela. Já apareceu até na roupa da minha mãe, lá na casa dela.
Faz mais de quatro meses que você partiu. Algumas dezenas de faxinas depois e ainda existe parte de você que insiste em ficar aqui. Mesmo depois da vida andar tanto pra frente.
Às vezes parece que faz muito tempo. Às vezes parece que não.
O vazio já faz parte da casa. A gente se acostuma, não tem outro jeito.
Mas, no silêncio dos pensamentos, você ainda está aqui.
“Tanto o sono como o tédio são estados de inatividade. O sono é o ponto alto do relaxamento do corpo, enquanto o tédio é o ponto alto do relaxamento espiritual”.
Ele é o único elo entre o eu de hoje e o eu de quando ainda nem existia a internet.
Me lembro das horas da infância e juventude reclamando de não ter nada pra fazer. Esses momentos eram dádivas a que só dei valor mais tarde, ao passar horas diárias na frente de telas de variados tamanhos.
O que falta pra gente ser realmente feliz nos nossos tempos é um pouco de tédio, que eu associo com uma mente criativa. É preciso de um tempo para fermentar as ideias na cabeça e as informações interessantes que buscamos.
Não é preciso estar a par de tudo o que acontece com os nossos amigos (e inimigos) através das fotos e vídeos no Instagram. Essas informações irrelevantes “apodrecem” nosso cérebro. Não à toa o termo da vez é o brain rot.
Contra isso, tento catar os pequenos momentos de tédio. É um desafio diário, para o cérebro, estar numa fila sem olhar o celular, esperar um atendimento sem olhar o celular, esperar qualquer coisa SEM OLHAR A DROGA DO CELULAR.
Como dizia um cartaz da ilustradora Nastya Varlamova que vi numa exposição em Portugal: “Stop scrolling! Real life is calling”.
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Dicas de leitura
• Certa vez, na livraria, me chamou a atenção o título do livro infantil “Tédio das tardes sem fim“, de Gaël Faye e Hippolyte. Beleza no texto e nas ilustrações.
• “Vita contemplativa ou sobre a inatividade“, de Byung-Chul Han. Sobre buscar de volta a nossa capacidade de não fazer nada.
Aproveitei um feriado esticado para fugir da cidade mais uma vez.
Depois de horas de estrada asfaltada e uma hora de estrada de terra, cheguei ao refúgio escolhido. As primeiras “pessoas” que conheci foi a cadela Fauna e a criança Flora.
Lá estava eu, num chalé de frente prum lago com tilápias, que logo mais seriam saboreadas no primeiro almoço feito no local.
Dali pra frente minha missão era simples, porém nobre. Dormir, comer, ler e ficar em contato com a natureza. E, claro, deixar o celular bem longe disso tudo.
Dida e sua família nos recebeu maravilhosamente bem. Cozinhou todos os dias com capricho único, utilizando a matéria-prima que ela mesma plantou e colheu: arroz, feijão, milho crioulo, mandioca, rúcula. Sem contar nos pães e pizzas de fermentação natural, na geleia de morango e jabuticaba, iogurte, mel, bolos, doce de pera e chás. Tudo feito por ela.
Depois de algumas horas fui surpreendida pela carinhosa gata Íris, que fez companhia por toda a estadia.
Entre um passeio no campo e outro na trilha, as leituras que me acompanharam nesses dias preguiçosos foram o Caderno proibido, de Alba de Céspedes e De quatro, de Miranda July.
Gosto quando o tempo passa devagar, assim tenho como prestar atenção aos meus pensamentos e chegar a algumas conclusões e vontades na vida.
“Aprender a compreender as coisas mínimas que acontecem todos os dias talvez seja aprender a compreender realmente o significado mais recôndito da vida”. (Alba de Céspedes)
Trago comigo as boas lembranças desses dias no meio do mato.
Outro dia escrevi aqui sobre a minha série de colagens Indecifráveis, que criei com as práticas experimentais no grupo Impossibilidade de esgotamento, idealizado pela artista visual Kamilla Nunes.
A boa notícia é que nesse 24 de abril, quinta-feira, será o lançamento da publicação “e: persuasões íntimas: e falar entre si: e uma liga de sólido e de frágil: e”, que é resultado do trabalho que desenvolvemos no último semestre de 2024.
“Estão contidas neste livro obras criadas a partir de diversas materialidades, como gravuras, carimbos, aquarelas, cianotipia, colagem, escrita, fotografia, entre outros, para tratar da relação entre sujeito-mundo a partir de uma referência primordial, ‘A teoria da bolsa de ficção’ da escritora Ursula K. Le Guin”, explica a editora e coordenadora do grupo.
Além das páginas com três colagens que desenvolvi, o livro contém obras de outros 38 artistas, impressas nas 192 páginas.
O lançamento será a partir das 19h, na Fundação Cultural BADESC, em Florianópolis. A entrada é gratuita.
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e: persuasões íntimas: e falar entre si: e uma liga de sólido e de frágil: e Edição, curadoria e projeto editorial: Kamilla Nunes Cais Editora 192 páginas Exemplares à venda no lançamento (tiragem limitada)
Comecei a fuçar a internet no último ano do colégio. Era 1995 e a “rede mundial de computadores”, como brincamos nos dias de hoje, era tudo mato.
Comecei meu blog no início dos 2000 e com ele conheci muita gente legal. Várias delas são grande amigos que fazem parte da minha vida até hoje.
Na época, tinha leitores fiéis que participavam do assunto com seus comentários.
Tinha tretas também porque a internet reinventou a treta. Mal sabíamos que isso ia piorar muito no futuro.
Mas escrevo esse post para contar que eu tinha um leitor ilustre e ele contribuía com comentários generosos. Eu era uma menina de vinte e poucos anos escrevendo bobagens diárias e ele um jornalista conhecido aqui na ilha.
Mais tarde, pude conhecer pessoalmente o jornalista Carlos Damião, por quem eu nutri admiração e respeito.
Encontrávamos algumas vezes em eventos na cidade.
Da última vez que o vi, ele estava com problema de visão e andava devagar pelo centro da cidade. Mesmo assim me reconheceu e me chamou. Ele gostava de circular pelas ruas do centro e sempre estava atento aos acontecimentos da cidade e escrevia sobre isso.
Naquele dia entramos juntos num comitê atrás de adesivos, pois era época de campanha presidencial.
Ele contou dos novos projetos. Estava aprendendo como gravar e editar seu próprio podcast, que seria lançado logo mais.
Ainda não sabíamos que esses projetos nunca sairiam do papel. Pouco tempo depois soube de sua morte, sozinho, em casa.
Esse é um post de agradecimento e em memória do jornalista Carlos Damião.
Voltaria pra casa, depois de uma viagem à Minas com a minha família.
Me avisaram em cima da hora o dia do retorno e eu teria que arrumar a mala correndo, na noite da véspera.
Já chateada por ter sido avisada em cima da hora, fui enfim separar tudo. Alguns amigos me acompanhavam.
Só daí me dei conta da quantidade de coisas que levei. Entre muitas roupas inúteis, havia um par de luvas de quando eu era criança. Nem cabiam nas minhas mãos adultas de hoje. Os amigos riram.
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Enquanto eu corria na esteira nesta manhã, pensava sobre meu sonho.
Pensava sobre a quantidade de coisas inúteis que levo pra lá e pra cá nessa vida. Coisas que já não me servem mais. Coisas que não me fazem mais sentido algum.